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CANAPÉS SORRIDENTES

Lucas, médico, 48 anos, pele morena e um belo físico, em suas horas de descontração corria para o micro em busca de amizades ou algo mais. Achava-se um experiente internauta quando conheceu Bia, uma encantadora e sedutora mulher de 35 anos. Durante meses trocaram e-mails e URLs. Mal ele conectava e já estava ali o sonoro aviso do ICQ com uma nova mensagem. Com o passar do tempo, Lucas cada vez mais encantado por Bia, os encontros virtuais tornaram-se cada vez mais picantes e excitantes. O micro já não era o suficiente e passaram a trocar juras e afetos pelo telefone. Que voz tinha aquela mulher! Todo bate-papo terminava em sexo e se deliciavam chegando juntos ao orgasmo.

Após oito meses ininterruptos, resolveram se encontrar. Lucas achou perfeito, pois já não agüentava mais aquela tortura. Precisava e desejava aquela mulher como nunca imaginou ser possível acontecer com ele.

O encontro prometia a perfeição. Bia morava sozinha e ambos resolveram dedicar aquela tarde toda ao amor. Lucas, muito gentil, comprou flores e bombons. Bia, por sua vez, preparou todo o ambiente de forma aconchegante. Na mesinha de centro canapés, uma cesta de frutas bem sugestivas e balde com gelo para o vinho que refrescava na geladeira. Claro que as cervejas estavam numa temperatura irrecusável.


Nelson Kristen

Lucas chegou no horário combinado e teve o cuidado de subir a escada, não havia elevador, sem pressa para que nenhuma gotinha de suor viesse atrapalhar o dia tão esperado. À medida que se aproximava do 201 seu coração batia mais forte ao lembrar de voz tão sensual. Últimos retoques e a sonora campainha fez com que a porta começasse a abrir tornando aquele instante numa eternidade para finalmente estar com Bia. Ali estava ela, diante de um homem agora sem voz, sem ar e sem ação com os olhos fixos naquela mulher de uns cento e sessenta quilos, cálculo feito em segundos, com uma camisola transparente, um sorriso amarelo e um olhar de desejo. Lucas não sabia o que fazer, ou melhor, nada conseguia fazer. Suas pernas não se moviam, o sorriso e a fala lhe fugiram completamente.

Em fração de segundos relacionou aquela imagem a sua frente com os orgasmos enlouquecedores. Não havia como voltar atrás e sair correndo como foi sua primeira tentativa de reação. Conduzido então por Bia, viu-se em pé, estático, no meio daquela sala que convidava ao amor. As frutas e os canapés estavam ali sorrindo para ele, mas Lucas só sentia o suor que nessa hora já tomava conta de todo seu corpo. Ela, numa tentativa de tornar o momento mais íntimo, tratou logo de colocar o vinho no balde e trazer cerveja para que seu amado escolhesse entre os dois. A sala era bem grande, o que facilitava Lucas a posicionar-se em lugares diferentes todas as vezes que ela se aproximava, tamanha era sua lentidão ao caminhar. Para sorte de Lucas, toda hora o telefone tocava e Bia enquanto síndica não podia deixar de atender aos moradores que se encontravam indignados com a falta d’água repentina em função de um descuido da pobre coitada.

Bia então, apontou o sofá onde Lucas sentou-se timidamente acreditando ser ali que tudo poderia acontecer. Todo o espaço restante foi ocupado pela, até então, sua amada e na primeira iniciativa de um beijo Lucas foi salvo por mais um condômino aborrecido. Foi o tempo suficiente para que o acuado médico fosse tomar um ar na janela e pensar que não poderia defender-se atrás de telefonemas para sempre.

Um CD, ao som de Clair de Lune não permitiu que os dois percebessem que havia alguém tocando a campainha, o que fez com que a mãe de Bia, uma senhora tão gorda quanto ela, abrisse a porta com sua própria chave e ao se deparar com aquele cena perguntou:

_ Atrapallho......?

E num salto imediato atravessando a porta Lucas gritou:

_ Nãaaaaaaaaaaaooooooo....!

Já na calçada, aliviado por ter lhe voltado o ar, pegou um lenço, enxugou o suor e sorrindo caminhou sem olhar para trás pensando na única palavra que conseguiu falar naquela tarde de amor.

Teresa Moreira
05122000

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